quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Os limites éticos da publicidade.



A discussão abaixo é muito relevante, posto que nos apresenta um tema atual, qual seja, a ética nos meios de comunicação, e isso inclui a propaganda.
   
Vale ressaltar que é incompreensível a indignação do publicitário criador deste chamariz, que ao meu ver foi totalmente desnecessáro.

Vivemos em uma sociedade livre, inclusive aberta a expressão do pensamento, mas muitos vezes as pessoas se equivocam no que podem  ou não propagarem em termos de declarações publicas.

Ora, não é segredo que há limites nos anúncios comerciais, principalmente quando estes se pautam em conteúdos de violência, racismo e sexismo.

Ao nos deparamos com esse tipo de publicidade nos questionamos se há realmente necessidade da exposição da mulher neste formato para se vender um produto.

As empresas ao realizarem as campanhas publicitárias devem ter em mente a necessidade de se manter o equilíbrio na divulgação de conteúedo, algo difícil, mas necessário, visto que quem se dispõem a expor uma marca, um produto, deve compreender que o faz não para sí, e também não para um pequeno grupo, geralmente as informações são repassadas para toda a sociedade ou seja,  devem atrair os clientes sem chocá-los, sem manipulá-los e sem causar-lhes qualquer tipo de constrangimento. 
A Ética na publicidade é um conceito nebuloso, mas seus objetivos devem primar pela segurança de seus clientes, tudo isso  para evitar que seus consumidores sejam atingidos em seus valores, e possam inclusive criarem falsas expectativas sobre o produto e possam se ofender pela forma dos anuncios vinculados.

A verdade é que olhando anúncios como esses  tenho a sensação de que a sociedade não percebe quão fora custoso para as mulheres alcançarem um patamar de humanização, de deixarem de serem consideradas apenas simples objetos de desejo para assumirem o lugar que sempre lhes pertenceu, ou seja, para serem consideradas pessoas capazes de assumirem resposabilidades, de decidirebem sobre suas vidas, de escolherem os seus destinos, o que é o oposto da idéia ali indicada.
A propaganda em questão é sexista ou seja, ela nitidamente privilegia o  gênero masculino sobre a condição feminina , que neste caso está misturada com o objeto vendido.
 Embora possa acreditar que a propaganda seja o inverso, ou seja, um grito de independencia feminina, ela na verdade é uma reprodução da idéia machista sobre a sexualidade da mulher.


O mais interessante disto tudo é que não há sequer a preocupação em verificar o que dispõem a legislação consumerista para que antes de se lançar uma campanha como essa se observar os limites da propagação desta ideia.
O CDC define como  publicidade abusiva  aquela que agride os valores sociais e éticos de uma população, por isso  segundo Viviane Brigantin: “ o direito, sendo o conjunto de normas destinadas a disciplinar o convívio do homem em sociedade, e porque visa ao bem-comum e ao alcance do que é justo e correto, preocupa-se não só com os interesses mercadológicos do fornecedor, mas também, e, principalmente, com a não propagação de valores contrários aos preceitos fundamentais de dignidade da pessoa humana, da equidade, da justiça, além de se inspirar nos mais áureos postulados da ética e da moral, preservando, assim, a ordem pública e o interesse social, protegendo e defendendo o consumidor, como rege o art.1° do CDC, reafirmando o já disposto na Lei Maior, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, e art. 48 de suas Disposições Transitórias.”
Acreditar que quem faz propaganda está livre para bem criar o que entende ser correto é um ledo engano, inclusive porque os meios de comunicação e a publicidade necessitam ajustar-se a esses ditames superiores, aos valores éticos e sociais da pessoa e da família (art. 221, IV, Constituição Federal de 1988).
Outro fato para ser considerado é se esse tipo de publicidade não incentiva comportamentos que vão além do interesse pelo produto anunciado, no qual acredito que podem desembocar na deturpação da vontade do consumidor, que pode, inclusive, ser induzido a comportamento prejudicial ou perigoso à sua saúde e segurança.

É inadmissível a publicidade que apresente a mulher como um mero objeto, e com um sentido dubio de seu caráter, inclusive levando a acreditar que ao comprar o produto se poderá fazer sexo com a mesma.
E aqui não se fala de moralismo, se fala de conquistas, e garantias, valores que muitas vezes são relegados ao desrespeito.
Observemos abaixo um texto muito interessante sobre esse tipo de publicidade:

Blog do Rizzatto Nunes

O incrível e descarado abuso da publicidade machista

Einstein disse: “Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri a certeza absoluta”. Dentre as várias funções das normas jurídicas (determinar ações, gerir comportamentos, educar, exemplificar, permitir, proibir etc), uma delas e que não é muito tratada pelos estudiosos é essa de limitar a estupidez humana. 

Parece mesmo que o ser humano, largado a si  mesmo, sem  freios e direções, é capaz de atos horrorosos. Dentre estes,  cuidarei de um que  pode causar danos ao estimular outros atos mais terríveis.  Volto a falar de publicidade, desta feita especificamente da abusiva. Por sorte, a lei já regula o assunto há mais de vinte e um anos.


 Nas últimas semanas, o noticiário mostrou a indignação de centenas de consumidores que protestaram nas redes sociais contra dois anúncios que estimulavam a violência sexual contra as mulheres: um dos preservativos Prudence e outro da cerveja Nova Schin.

 Examinando os dois anúncios, vi estarrecido que tudo indica que seus criadores perderam mesmo  a noção dos limites, aliás, bem definidos no Código de Defesa do Consumidor. Lembro, a seguir, o teor do texto legal, embora pense  que, no caso, não haveria necessidade alguma de que a lei dissesse algo.

 Bastava que os anunciantes e os criadores do anúncio tivessem um pouco mais de bom senso e respeito para com as mulheres. Mas, como não tiveram, é bom que saibam o que a lei estipula a  respeito. Eis os termos legais:

“Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.” “Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança: Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa”

A publicidade do preservativo foi colocada na página da Prudence no Facebook no dia 16 de julho p.p. e depois das reclamações foi suprimida em 30 de julho.  O anúncio trazia um foto de um rosto de mulher e sobre ele, em letras graúdas estava escrito: "Dieta do Sexo". Ao lado era apresentada uma tabela que  mostrava  quantas calorias seria possível perder praticando diferentes formas de atos sexuais. Entre estes, aparecia no topo da foto: “Sexo com o consentimento – 10 calorias; Sem o consentimento dela  – 190 calorias”. Na sequência, outra forma: “Com as duas mãos – 8 calorias; com uma mão – 32 calorias; com uma mão, apanhando dela – 208 calorias”.

Apesar do absurdo do anúncio, evidentemente sexista e que dava a entender que o homem pode sim praticar sexo contra a vontade da mulher que está em seus braços (o que caracteriza estupro), após o protesto nas redes sociais a empresa ainda tentou justifica-lo,  como mostra o site SOF-Sempreviva Organização Feminista (www.sog.org.br):  “Em um primeiro momento, a Preservativos Prudence buscou, no espaço de comentários da imagem no Facebook, justificar a situação. Disse ser contrária à violência, alegando que a propaganda não faz apologia a estupro, mas sim à ´conquista´. Ou seja, de acordo com a empresa, fazer sexo sem o consentimento da mulher é conquistá-la . Na tentativa de consertar a situação, só conseguiu piorá-la. Ao invés de reconhecer que a propaganda faz apologia a um crime, colocou esse tipo de agressão como algo normal, banal, uma mera ´conquista´. 

Há de se lembrar que a minimização do estupro é uma das causas pelas quais as vítimas não têm apoio, e muitas vezes nem conseguem efetivar uma denúncia. Quando tomam a iniciativa de denunciar o agressor, é comum ainda serem responsabilizadas pela própria agressão devido a seu  ´ comportamento permissivo”.

Não só praticaram o abuso, como violaram a lei e ainda tentaram justificar, antes de retirar de circulação a peça ilegal. E não é que,  logo depois, a fabricante da cerveja Nova Schin cololocou no ar uma publicidade que fazia a mesma coisa!  No anúncio veiculado nas tevês, está  um grupo de homens jovens reunidos num quiosque numa praia, olhando para  as mulheres na areia. De repente, um deles diz: “Já pensou se a gente fosse invisível?”. 

Na sequência, duas mulheres que caminham pela praia sentem que são tocadas pelas costas por pessoas invisíveis. Depois, as cenas mostram algumas mulheres saindo de um vestiário, invadido pelos invisíveis,  sem a parte de cima do biquíni. Nas duas cenas, as mulheres se assustam e fogem.

Esses são apenas mais dois exemplos dos abusos impunemente praticados via publicidade comercial, nesses casos contra a dignidade das mulheres. Nos anúncios de cerveja, aliás,  a falta de criatividade que impera no setor é tamanha que há muitos anos que a mesma ladainha machista de mulheres e cervejas vem sendo repetida; a novidade é agora ser insinuado que o “sexo cervejeiro” pode ser feito contra a vontade da mulher. Mais um caso de incentivo ao estupro.

Já  disse aqui que  um dos grandes problemas do consumidor na sociedade capitalista é o de sua dificuldade em se defender publicamente contra tudo o que lhe fazem de mal. Se ele é enganado, sofre um dano etc tem de recorrer aos órgãos de proteção ao consumidor ou contratar um advogado. Mas, há esperança. Ela esta nas redes sociais da internet e no surgimento de sites de reclamações.

 Aos poucos, os consumidores vão encontrando um caminho para expressar sua insatisfação com os produtos e serviços adquiridos e também contra toda forma de malandragem perpetrada por muitos fornecedores, além, claro, de protestar contra a publicidade enganosa e abusiva.

No caso desses incríveis dois anúncios, o repúdio via redes sociais foi muito grande, o que é alvissareiro. Em matéria de publicidade machista, penso que o boicote dos consumidores seria o melhor remédio para coibi-los. 

Boicote não só das mulheres, mas também dos homens de bem que não podem  se calar diante dos delitos. Os maus empresários só conhecem um modo de fracasso: a perda em suas vendas.

Daí, unindo-me a todos aqueles que se expressaram contra esses anúncios, termino transcrevendo trecho do ótimo e indignado texto publicado no Blogueiras Feministas (www.blogueirasfeministas.com): “Isso é engraçado, Nova Schin? Mulheres amedrontadas porque têm suas roupas arrancadas e seus corpos tocados sem permissão é motivo de riso?  Que tal falar que ´é só uma piada´ para as milhares de mulheres que são diariamente vítimas de abuso sexual em nosso país? Que tal dizer que isso tudo não passa de ´ficção´ para as milhares de mulheres que são abusadas por homens em metrôs, ônibus e trens? Por que você não encara  as meninas que são vendidas pelo tráfico sexual, as prostitutas espancadas, as esposas estupradas por maridos, as estudantes violentadas no próprio ambiente universitário? Por que você não exibe esse vídeo para as mulheres que sofrem todos os dias devido a essa mentalidade perpetuada por vocês? Essa mentalidade de que os homens têm o direito inquestionável de extrair diversão daquilo que para nós mulheres é um terror diário”