quarta-feira, 30 de março de 2011

Legalidade de radares fotográficos

O Código de Trânsito Brasileiro (Lei n. 9.503/97), no seu Capítulo XVIII, quando trata do "Processo Administrativo" (art. 280 2 e 3) permitiu que o auto de infração de trânsito pudesse ser lavrado não somente pela autoridade mas também pelo seu agente (servidor civil, estatutário ou celetista, e militar), utilizando-se da ajuda de aparelho eletrônico (ex: radar) ou qualquer outro meio tecnológico disponível para comprovar a infração cometida pelo motorista.

Quanto ao "Processo Administrativo" punitivo (é básico ao estudo jurídico) ele percorre obrigatoriamente as seguintes fases: "instauração (através da portaria ou auto de infração), instrução (para elucidar os fatos), defesa (ampla, com possibilidade de contestação e provas), relatório e julgamento final (prolatado pela autoridade competente). Reforçando esta lição, a atual constituição de 1988, no seu artigo 5, LV, garante a ampla defesa e o contraditório em qualquer processo administrativo.
No entanto, ao que parece, os órgãos públicos estão aplicando penalidades administrativas aos motoristas infratores, sobretudo a multa, sem a ampla defesa e contraditório. Ou seja, o poder público está punindo administrativamente, com multa, suspensão da carteira de habilitação, pontuação na carteira etc... sem oportunidade de defesa ao autuado. Mas a penalidade da infração de trânsito, assim como qualquer decisão administrativa punitiva, sobretudo porque condena um cidadão, para não cair na arbitrariedade, terá legalidade somente se observar aquelas garantias constitucionais.
O direito brasileiro, com o advento da Constituição de 1988 não admite a existência de processo administrativo sem a oportunidade de defesa. Do contrário, tal punição, juridicamente, torna-se nula, porque inconstitucional.

Não bastasse a alegação de que muitas dessas penalidades soam como legalmente nulas, (porque ferem o "devido processo legal"), mais grave é qualificá-los de inexistentes juridicamente, por falta de participação da autoridade competente.

Ora, o CTB diz que o agente da autoridade de trânsito poderá lavrar o auto de infração valendo-se do uso de equipamentos eletrônicos. Porém, somente a própria autoridade de trânsito (ex: Delegado de Trânsito, Diretor da Polícia Rodoviária Federal, Chefe do Detran, Prefeito Municipal, Secretário Municipal de Trânsito, etc...) é quem "julgará consistente o auto de infração e aplicará a penalidade cabível (art. 281 do CTB)". Ou seja, o agente lavrando um auto de infração provoca o início do processo administrativo. Mas este processo terá que ser presidido e julgado pela autoridade de trânsito. Legalmente, nem o agente, nem os equipamentos eletrônicos podem efetuar julgamentos ou aplicar penalidades. Elas terão valor jurídico apenas se emanadas da autoridade competente (art. 5, LIII, CF).

Sabe-se porém que ao invés de primeiramente notificarem os infratores da lavratura do auto de infração, abrindo-se prazo para defesa, o poder público está comunicando de imediato a penalidade aplicada ao motorista. Muitos deles estão recebendo pelo correio uma simples comunicação da condenação, e nela sequer consta o nome ou assinatura da autoridade que teria julgado a infração, nem os fundamentos obrigatórios da decisão, sequer o número do processo administrativo ou oportunidade de defesa. Depois de condenado, ele recebe prazo para recorrer à Jari, cujo recurso, contrariando a regra geral, não tem o benefício do efeito suspensivo (art. 285, 1, do CTB), exceto para a pena da multa.

Todos desejamos que os infratores sejam exemplarmente punidos com rigor. Isto fatalmente ocorrerá ao final de cada processo, sobretudo quando contar com a prova técnica detectada pelo radar. Porém, o que não podemos assistir é o poder público afastar-se do cumprimento do CTB e da Constituição Federal, como fazem os maus motoristas.

Infelizmente, no que tange as punições às infrações de trânsito parece que estamos assistindo a práticas administrativas absolutistas e condenações sumárias. Esta condenação sem defesa, que entendemos ser ilegal (inexistente ou nula), é pouco democrática e não promove a cidadania.

O artigo de autoria do Dr. "Doorgal G. Borges de Andrada, Juiz de Direito em Uberlândia - MG", publicado no Jornal "Estado de Minas" - MG do dia 09.02.2001, resume o entendimento perfeito sobre a aplicação correta das normas de trânsito, no que se refere ao amplo direito de defesa preconizado no Código de Trânsito Brasileiro - CTB e na Constituição Brasileira.

Um dos temas constantes do Código que tem recebido maior destaque é o rigor das penalidades, não só pelo valor das multas, mas também pelas
conseqüências da pontuação que pode culminar com a suspensão do direito de dirigir. De outro lado, na mesma proporção que existe a rigorosidade da lei, deve haver a garantia da ampla defesa do cidadão, sendo a "Defesa Previa" um dos instrumentos de fundamental importância para a justa aplicação da lei.

A "Defesa Prévia", instituída na vigência do Código anterior pela Resolução n.º 568/80, do CONTRAN, consiste no direito de o cidadão contestar, seja por irregularidades formais, ou de mérito, a consistência da autuação lavrada pela autoridade de trânsito ou seus agentes, antes da aplicação da penalidade, ou seja, a "Defesa Prévia" situa-se após a autuação e antes da aplicação da penalidade, cuja competência é privativa da autoridade de trânsito a qual deve ser dirigida a petição (dirigente do DETRAN, do órgão de trânsito municipal, DER, DPRF, etc).

Alguns dirigentes de órgãos de trânsito têm entendido que a "Defesa Prévia" teria sido extinta por não estar explícita no CTB, mas ela continua a vigorar, uma vez que a Resolução nº 568/80, do CONTRAN, por não conflitar com o novo Código, permanece vigente nos termos do art. 314, parágrafo único, do CTB. Além disso, o art. 281 do referido Código estabelece que a autoridade de trânsito "julgará" a consistência do auto> de infração.

A "Defesa Prévia" está no cerne do verbo "julgará". Para alguém "julgar" é fundamental que seja oportunizado o contraditório entre as partes envolvidas. Se o agente autua, tem o acusado o direito de contestar a autuação para que o "julgamento" sobre a consistência do ato do agente seja pleno, tanto sob o ponto de vista técnico, legal e de mérito.

Somente após o julgamento é que poderá ser aplicada a penalidade, cabendo aí, sim, "o recurso" à JARI, ao CETRAN ou ao CONTRAN, conforme o caso, obedecidos os prazos legais. Somente após esgotados os recursos é que a pontuação deverá ser atribuída ao verdadeiro infrator (art. 281 a 290 do CTB).

Neste sentido vale recordar que a 1ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) reconheceu a legalidade do uso de radares fotográficos automáticos _também conhecidos como "pardais"_ para aplicação de multas de trânsito. Na primeira vez em que o tema foi debatido naquele tribunal, o ministro relator do recurso, Luiz Fux, entendeu que os radares não aplicam as multas, mas apenas fornecem elementos factuais que facilitam a imposição de sanções legais.

Segundo a assessoria do STJ, a assessoria comercial Arsky acionou o Detran (Departamento de Trânsito) do Distrito Federal e o DER (Departamento de Estradas de Rodagem) distrital com o objetivo de obter uma declaração de nulidade das autuações e multas de trânsito por excesso de velocidade. A empresa alegava que os motivos para essa nulidade decorriam tanto da ausência de identificação do condutor do veículo infrator quanto do agente de trânsito autuador da infração.

A primeira instância, com base no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), julgou o pedido improcedente, assim como o TJ-DF (Tribunal de Justiça do Distrito Federal) negou por unanimidade a apelação da autora.

De acordo com informações da assessoria do STJ, o caso chegou ao tribunal através de um recurso especial, no qual a empresa alegou que o CTB exige a identificação do fiscal de trânsito, o que não ocorre nos casos de notificações por excesso de velocidade, emitidas por dispositivos eletrônicos. A lei, segundo o entendimento da defesa, exigiria a presença de um elemento humano.

No entanto, o relator entendeu que tanto a lei quanto resoluções do Contran (Conselho Nacional de Trânsito) explicitamente afastam a necessidade da presença de fiscais no momento do registro da infração. Ele também destacou a importância dos "pardais" para conter os altos índices de acidentes.

A legalidade da multa trafegária imposta por radar e outros equipamentos eletrônicos frente ao devido processo legal

Segundo estatísticas divulgadas por jornais, revistas e outros órgãos de comunicação, o Brasil passou a ter cerca de 2000 (dois mil) radares nas estradas no ano de 2002.

Isso é preocupante, já que continua existindo, nos dias atuais, uma enorme discussão em razão da implantação desses equipamentos eletrônicos que, segundo alguns críticos e consultores jurídicos, estão sendo utilizados contra os motoristas sem o devido respeito à Lei.

Além da falibilidade do citado objeto eletrônico, seja por dano, temperatura, trepidações, interferência eletromagnética ou falha qualquer, a autoridade de trânsito, desprovida que é da legitimidade e da legalidade, posto que não há Lei outorgando-lhe tal autoridade e competência, mesmo assim tem exercido seu poder de polícia, nas estradas e municípios, subjugando e infligindo ao cidadão sanção carente da certeza de autoria e desprovida de sua materialidade, fazendo recrudescer uma verdadeira avalanche de multas.

É o infrator quem deve ser punido pela infração cometida. Então, como provar que, realmente e de fato, foi o proprietário que infringiu a velocidade máxima permitida? Se há, ressabida e notoriamente, centenas de veículos com placas frias e outros clonados, e, vezes outras o usuário e/ou condutor do veículo não é o proprietário, ou até mesmo tenha excedido à velocidade máxima permitida e limite para determinada via.

Ademais, se a velocidade máxima permitida é de 100 ou 80 KM, nas estradas e vias de trânsito rápido, e de 60 KM nas vias principais, por quê os veículos são fabricados com capacidade e potência para alcançar 200, 220, 240 quilômetros por hora? A razão é muito simples: tudo gira em torno do vil metal e do poder econômico, que se alimenta através dessas centenas de milhares de multas e inúmeras empresas de radares e sensores.

O próprio Código de Trânsito Brasileiro tratando-se do Processo Administrativo é que permitiu que o auto de infração de trânsito fosse lavrado pelos seus agentes com a ajuda de aparelhos eletrônicos. Assim, multas, suspensão e pontuação nas carteiras de habilitação- as chamadas penalidades administrativas – através da colaboração dos radares, vêm sendo aplicadas sem que seja levado em consideração pelas autoridades o fato de que toda pessoa tem direito à plena defesa quando acionada pela Justiça, nos termos da Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, LV, pelo qual se garante ao indivíduo os princípios da Ampla Defesa e o Contraditório.

Dispõe o art. 5º, LV da Constituição Federal:

“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Fica assim o cidadão à mercê deste “poder” sem sequer poder exercer o contraditório e a garantia da ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes, visto que não há possibilidade de se argumentar com uma máquina, posto que se vê diante de uma situação de flagrante preparado eletronicamente. Situação esta que torna o ser humano, o cidadão inocente em refém, escravo e subjugado à máquina que ele mesmo criou.

Inobstante os efeitos positivos que, aparentemente, possam resultar de sua eficácia e presteza em flagrar o infrator e, mais ainda, em fotografar este flagrante, trata-se de mero objeto eletroeletrônico - produto do homem, portanto falível -, simples coisa sem tirocínio, sem raciocínio e, portanto, sem discricionariedade: uma máquina controla, fiscaliza, notifica, autua e sentencia o ser humano ao adimplemento de uma obrigação pecuniária.

O que tem ocorrido é que em virtude das infrações de trânsito as penalidades estão sendo aplicadas atentando quanto ao Princípio do Devido Processo Legal, vindo a multa a ser imposta sem que tenha havido um processo, o que, de fato, contraria a nossa Constituição (art. 5º, LIV, CF/88). Assim, a nenhum cidadão poderá ser imposta uma pena a não ser que tenham sido seguidos os devidos passos processuais, de acordo com a Lei.

Em função da contínua modernização da tecnologia, o motorista multado por excesso de velocidade recebe algum tempo depois em suas própria residência a “notícia” de que foi “pêgo” pelo sistema de radar. Restam-lhe, porém, algumas alternativas, tais como efetuar o pagamento ou recorrer ao JARI. Até que existe orientação na notificação eletrônica ao usuário para, querendo e em até trinta dias, tentar impugnar ou contestar a “notificação”. Todavia, esta somente é enviada após decorridos dois, três, quatro ou até seis meses da data da infração. Assim, como contestar ou impugnar?

Doutra banda, nunca será demais lembrar quê, a rigor, toda e qualquer notificação só deverá ser considerada legal se houver a assinatura da autoridade que autuou e a respectiva assinatura do condutor infrator, consoante preconiza o art. 280, I a VI do Código de trânsito Brasileiro:

Art. 280. “Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará: I – tipificação da infração; II- local, data e hora do cometimento da infração; III – caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à sua identificação; IV – o prontuário do condutor, sempre que possível; V – identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador ou equipamento que comprovar a infração; VI – assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração. § 1º VETADO. § 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN”.(...). Note-se porém, que é imprescindível que o CONTRAN tenha regulamentado previamente o aparelho eletrônico. Como se sabe, notoriamente, há por esse imenso país um excessivo senão multivariado incremento desses ditos sensores ou redutores de velocidade ou lombadas eletrônicas, num verdadeiro arsenal de equipamentos, petrechos e aprestos, simplesmente para flagrar e “autuar eletronicamente”, nunca para orientar ou para educar ao motorista, usuário e condutor, sendo que não se sabe ao certo quais deles estão previamente regulamentados pelo CONTRAN.

Várias manifestações já ocorreram contra os radares e até mesmo sites na Internet têm buscado juntar assinaturas no combate aos mesmos. Obviamente, com o intuito de proteger os interesses do Estado, as autoridades estão buscando formas para se defender alegando a segurança e vantagem que tais equipamentos podem oferecer nos termos de redução de acidentes e principalmente na redução de mortes nas estradas. Realmente, de acordo com estatísticas previstas pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) divulgadas em dezembro do ano passado, os radares podem reduzir em até 30% (trinta por cento) os acidentes e em 60% (sessenta por cento) o número de vítimas fatais. Todavia, a redução ou minimização dos acidentes é considerada inexpressiva ante ao incomensurável número de autuações, multas ou notificações. Não se trata, porém, de um combate que esteja visando a extinção dos radares, o quê, nos dias atuais, é humanamente impossível, mas sim a busca de uma solução, de uma forma justa de se impor a penalidade e, ao mesmo tempo, permitir que as pessoas tenham a possibilidade e uma maior facilidade para se defenderem.

Ao que parece, entretanto, os motoristas não estão se convencendo da importância dos radares, araras, pardais, etc., pois muitos deles têm afirmado que, por trás desta tese de importância dos recursos eletrônicos, estaria a chamada indústria das multas, alimentada pelo Novo Código, responsável pelo arbitramento de valores elevados para as infrações e pela criação do sistema de pontos. Infelizmente não é a vida humana e muito menos ainda o exorbitante número de mortes que contam ou que interessam aos governos e administração pública, mas sim o quanto se pode efetivamente arrecadar e espoliar dos usuários e contribuintes, para aumentar mais e mais o bolo da arrecadação; enquanto isso, por sua vez, as nossas estradas, vias, ruas e rodovias permanecem péssimas, esburacadas, algumas até mesmo intransitáveis. Essa é a nossa dura e cruel realidade.

Diante de todas estas irregularidades, é de suma importância que pessoas que se sintam prejudicadas busquem e recorram à Justiça, mesmo havendo a enorme dificuldade de se obter um resultado favorável no caso de se promover um recurso... é fundamental que os cidadãos insistam e lutem pelos seus direitos ou, caso contrário, “pelo andar da carruagem”, as imposições serão cada vez mais severas.

Em meio a toda essa polêmica, aquele que gosta de “pisar fundo” deve se atentar tendo em vista que polícias rodoviárias, órgãos de estradas e demais autoridades estarão armadas na guerra contra o excesso de velocidade. Os motoristas brasileiros devem se adaptar a estas regras ou, do contrário, terão aqueles mais ousados de enfrentar e arcar com os custos da ousadia.

E, para todos, uma pequena lembrança: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei”; (art. 5º, II, Constituição Federal de 1988).



Notas:

SILVA LIMA. Fernando Machado da. – Multas de Trânsito, fotossensores e emplacamento de veículo – www.jus.com.br

GOUVEIA, Joilson Fernandes de. – Radar Fotográfico ou Sensor Eletrônico. www.jus.com.br

Estatísticas – matéria Estradas – www.uol.com.br