A discussão abaixo é muito relevante, posto que nos
apresenta um tema atual, qual seja, a ética nos meios de comunicação, e isso
inclui a propaganda.
Vale ressaltar que é incompreensível a indignação
do publicitário criador deste chamariz, que ao meu ver foi totalmente desnecessáro.
Vivemos
em uma sociedade livre, inclusive aberta a
expressão do pensamento, mas muitos vezes as pessoas se equivocam no que
podem ou não propagarem em termos de declarações publicas.
Ora, não é segredo que há limites nos anúncios
comerciais, principalmente quando estes se pautam em conteúdos de violência,
racismo e sexismo.
Ao nos deparamos com esse tipo de publicidade nos
questionamos se há realmente necessidade da exposição da mulher neste formato
para se vender um produto.
As
empresas ao realizarem as campanhas publicitárias devem ter em mente a
necessidade de se manter o equilíbrio na divulgação de conteúedo, algo
difícil, mas necessário, visto que quem se dispõem a expor uma marca, um
produto, deve compreender que o faz não para sí, e também não para um
pequeno grupo, geralmente as informações são repassadas para toda a
sociedade ou seja, devem atrair os clientes sem chocá-los, sem
manipulá-los e sem causar-lhes qualquer tipo de constrangimento.
A
Ética na publicidade é um conceito nebuloso, mas seus
objetivos devem primar pela segurança de seus clientes, tudo isso para
evitar que seus consumidores sejam atingidos em seus valores, e possam
inclusive criarem falsas expectativas sobre o produto e possam se
ofender pela forma dos anuncios vinculados.
A verdade
é que olhando anúncios como esses tenho
a sensação de que a sociedade não percebe quão fora custoso para as
mulheres alcançarem
um patamar de humanização, de deixarem de serem consideradas apenas
simples
objetos de desejo para assumirem o lugar que sempre lhes pertenceu, ou
seja, para serem consideradas pessoas capazes de assumirem
resposabilidades, de decidirebem sobre suas vidas, de escolherem os seus
destinos, o que é o oposto da idéia ali indicada.
A
propaganda em questão é sexista ou seja, ela nitidamente privilegia o
gênero masculino sobre a condição feminina , que neste caso está
misturada com o objeto vendido.
Embora
possa acreditar que a propaganda seja o inverso, ou seja, um grito de
independencia feminina, ela na verdade é uma reprodução da idéia
machista sobre a sexualidade da mulher.
O mais
interessante disto tudo é que não há sequer a preocupação em verificar o que dispõem
a legislação consumerista para que antes de se lançar uma campanha como essa se
observar os limites da propagação desta ideia.
O
CDC define como publicidade abusiva aquela que agride os valores sociais e éticos
de uma população, por isso segundo
Viviane Brigantin: “ o direito, sendo o
conjunto de normas destinadas a disciplinar o convívio do homem em sociedade, e
porque visa ao bem-comum e ao alcance do que é justo e correto, preocupa-se não
só com os interesses mercadológicos do fornecedor, mas também, e,
principalmente, com a não propagação de valores contrários aos preceitos
fundamentais de dignidade da pessoa humana, da equidade, da justiça, além de se
inspirar nos mais áureos postulados da ética e da moral, preservando, assim, a
ordem pública e o interesse social, protegendo e defendendo o consumidor, como
rege o art.1° do CDC, reafirmando o já disposto na Lei Maior, nos termos dos
arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, e art. 48 de suas Disposições
Transitórias.”
Acreditar
que quem faz propaganda está livre para bem criar o que entende ser correto é
um ledo engano, inclusive porque os meios de comunicação e a publicidade
necessitam ajustar-se a esses ditames superiores, aos valores éticos e sociais
da pessoa e da família (art. 221, IV, Constituição Federal de 1988).
Outro
fato para ser considerado é se esse tipo de publicidade não incentiva comportamentos
que vão além do interesse pelo produto anunciado, no qual acredito que podem
desembocar na deturpação da vontade do consumidor, que pode, inclusive, ser
induzido a comportamento prejudicial ou perigoso à sua saúde e segurança.
É
inadmissível a publicidade que apresente a mulher como um mero objeto, e com um
sentido dubio de seu caráter, inclusive levando a acreditar que ao comprar o
produto se poderá fazer sexo com a mesma.
E
aqui não se fala de moralismo, se fala de conquistas, e garantias, valores que
muitas vezes são relegados ao desrespeito.
Observemos
abaixo um texto muito interessante sobre esse tipo de publicidade:
por blogdorizzattonunes
Einstein disse: “Duas coisas
são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao
universo, ainda não adquiri a certeza absoluta”. Dentre as várias
funções das normas jurídicas (determinar ações, gerir comportamentos,
educar, exemplificar, permitir, proibir etc), uma delas e que não é
muito tratada pelos estudiosos é essa de limitar a estupidez humana.
Parece mesmo que o ser humano, largado a si mesmo, sem freios e
direções, é capaz de atos horrorosos. Dentre estes, cuidarei de um que
pode causar danos ao estimular outros atos mais terríveis. Volto a
falar de publicidade, desta feita especificamente da abusiva. Por sorte,
a lei já regula o assunto há mais de vinte e um anos.
Nas últimas semanas, o noticiário mostrou a indignação de centenas
de consumidores que protestaram nas redes sociais contra dois anúncios
que estimulavam a violência sexual contra as mulheres: um dos
preservativos Prudence e outro da cerveja Nova Schin.
Examinando os dois
anúncios, vi estarrecido que tudo indica que seus criadores perderam
mesmo a noção dos limites, aliás, bem definidos no Código de Defesa do
Consumidor. Lembro, a seguir, o teor do texto legal, embora pense que,
no caso, não haveria necessidade alguma de que a lei dissesse algo.
Bastava que os anunciantes e os criadores do anúncio tivessem um pouco
mais de bom senso e respeito para com as mulheres. Mas, como não
tiveram, é bom que saibam o que a lei estipula a respeito. Eis os
termos legais:
“Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer
natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se
aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança,
desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o
consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde
ou segurança.”
“Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser
capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou
perigosa a sua saúde ou segurança:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa”
A publicidade do preservativo foi colocada na página da Prudence no
Facebook no dia 16 de julho p.p. e depois das reclamações foi suprimida
em 30 de julho. O anúncio trazia um foto de um rosto de mulher e sobre
ele, em letras graúdas estava escrito: "Dieta do Sexo". Ao lado era
apresentada uma tabela que mostrava quantas calorias seria possível
perder praticando diferentes formas de atos sexuais. Entre estes,
aparecia no topo da foto: “Sexo com o consentimento – 10 calorias; Sem o
consentimento dela – 190 calorias”. Na sequência, outra forma: “Com as
duas mãos – 8 calorias; com uma mão – 32 calorias; com uma mão,
apanhando dela – 208 calorias”.
Apesar do absurdo do anúncio, evidentemente sexista e que dava a
entender que o homem pode sim praticar sexo contra a vontade da mulher
que está em seus braços (o que caracteriza estupro), após o protesto nas
redes sociais a empresa ainda tentou justifica-lo, como mostra o site
SOF-Sempreviva Organização Feminista (www.sog.org.br): “Em um primeiro
momento, a Preservativos Prudence buscou, no espaço de comentários da
imagem no Facebook, justificar a situação. Disse ser contrária à
violência, alegando que a propaganda não faz apologia a estupro, mas sim
à ´conquista´. Ou seja, de acordo com a empresa, fazer sexo sem o
consentimento da mulher é conquistá-la . Na tentativa de consertar a
situação, só conseguiu piorá-la. Ao invés de reconhecer que a propaganda
faz apologia a um crime, colocou esse tipo de agressão como algo
normal, banal, uma mera ´conquista´.
Há de se lembrar que a minimização
do estupro é uma das causas pelas quais as vítimas não têm apoio, e
muitas vezes nem conseguem efetivar uma denúncia. Quando tomam a
iniciativa de denunciar o agressor, é comum ainda serem
responsabilizadas pela própria agressão devido a seu ´ comportamento
permissivo”.
Não só praticaram o abuso, como violaram a lei e ainda tentaram
justificar, antes de retirar de circulação a peça ilegal. E não é que,
logo depois, a fabricante da cerveja Nova Schin cololocou no ar uma
publicidade que fazia a mesma coisa! No anúncio veiculado nas tevês,
está um grupo de homens jovens reunidos num quiosque numa praia,
olhando para as mulheres na areia. De repente, um deles diz: “Já pensou
se a gente fosse invisível?”.
Na sequência, duas mulheres que caminham
pela praia sentem que são tocadas pelas costas por pessoas invisíveis.
Depois, as cenas mostram algumas mulheres saindo de um vestiário,
invadido pelos invisíveis, sem a parte de cima do biquíni. Nas duas
cenas, as mulheres se assustam e fogem.
Esses são apenas mais dois exemplos dos abusos impunemente praticados
via publicidade comercial, nesses casos contra a dignidade das
mulheres. Nos anúncios de cerveja, aliás, a falta de criatividade que
impera no setor é tamanha que há muitos anos que a mesma ladainha
machista de mulheres e cervejas vem sendo repetida; a novidade é agora
ser insinuado que o “sexo cervejeiro” pode ser feito contra a vontade da
mulher. Mais um caso de incentivo ao estupro.
Já disse aqui que um dos grandes problemas do consumidor na
sociedade capitalista é o de sua dificuldade em se defender publicamente
contra tudo o que lhe fazem de mal. Se ele é enganado, sofre um dano
etc tem de recorrer aos órgãos de proteção ao consumidor ou contratar um
advogado. Mas, há esperança. Ela esta nas redes sociais da internet e
no surgimento de sites de reclamações.
Aos poucos, os consumidores vão
encontrando um caminho para expressar sua insatisfação com os produtos e
serviços adquiridos e também contra toda forma de malandragem
perpetrada por muitos fornecedores, além, claro, de protestar contra a
publicidade enganosa e abusiva.
No caso desses incríveis dois anúncios, o repúdio via redes sociais
foi muito grande, o que é alvissareiro. Em matéria de publicidade
machista, penso que o boicote dos consumidores seria o melhor remédio
para coibi-los.
Boicote não só das mulheres, mas também dos homens de
bem que não podem se calar diante dos delitos. Os maus empresários só
conhecem um modo de fracasso: a perda em suas vendas.
Daí, unindo-me a todos aqueles que se expressaram contra esses
anúncios, termino transcrevendo trecho do ótimo e indignado texto
publicado no Blogueiras Feministas (www.blogueirasfeministas.com): “Isso
é engraçado, Nova Schin? Mulheres amedrontadas porque têm suas roupas
arrancadas e seus corpos tocados sem permissão é motivo de riso? Que
tal falar que ´é só uma piada´ para as milhares de mulheres que são
diariamente vítimas de abuso sexual em nosso país? Que tal dizer que
isso tudo não passa de ´ficção´ para as milhares de mulheres que são
abusadas por homens em metrôs, ônibus e trens? Por que você não encara
as meninas que são vendidas pelo tráfico sexual, as prostitutas
espancadas, as esposas estupradas por maridos, as estudantes violentadas
no próprio ambiente universitário? Por que você não exibe esse vídeo
para as mulheres que sofrem todos os dias devido a essa mentalidade
perpetuada por vocês? Essa mentalidade de que os homens têm o direito
inquestionável de extrair diversão daquilo que para nós mulheres é um
terror diário”